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domingo, 9 de setembro de 2012

Belo Marques


Em Maio de 1993, o Município do Sobral prestou uma homenagem pública ao maestro Belo Marques. No programa da homenagem diz-se que, em 14 de Julho de 1963, foi estreada aos microfones da Emissora Nacional a Canção do Sobral, com letra de Ivo Reis Melo, interpretação de Maria Fernanda Soares e música de Belo Marques. Para além desta informação, o programa não diz, nem deixa entender, qual a razão de ser da homenagem. Sabe-se que Belo Marques é nome de uma rua no Sobral; sabe-se que nasceu na região da Batalha, que viveu em muitos locais um pouco por esse mundo fora, e está escrito que, retirado da vida pública, construiu uma casa na Arruda, onde morreu. Casa essa que, está escrito também, foi paga com o dinheiro ganho com a então muito conhecida canção “Alcobaça”, de cuja música o maestro foi autor.

Esta canção teve um grande sucesso popular em Portugal na década de 50/60 do século passado; e mesmo no estrangeiro: garantiu à intérprete, Maria de Lurdes Resende, a vitória no “Prémio da Canção de Sucesso”, realizado em Génova, Itália, em 1955.

Se a “Canção do Sobral” não teve este sucesso, isso não impediu que Belo Marques seja, ainda hoje, uma pessoa muito recordada no Concelho. Muita gente se lembra dele e a principal razão é esta: desde que se retirou e até ao seu último dia de vida ele viveu de facto, e ao contrário do que está escrito, no Sobral de Monte Agraço. Primeiro na Rua Miguel Bombarda, mesmo ao lado do quartel dos Bombeiros, e depois no Casal de Santa Rita, nas Pontes de Monfalim. Casa que, de resto, foi comprada por “400 contos”, dizia ele, e não construída. Corrijo também a data do óbito, que ocorreu não em 1986, mas no dia 27 de Março de 1987. Foi sepultado no cemitério de Santo Quintino, conforme o atesta o documento junto.

Não pretendo fazer aqui uma biografia de Belo Marques: é fácil encontrá-la na net, no livro que escreveu, ou no programa da citada homenagem; por outro lado, os familiares mantêm uma página no “facebook” em nome dele, onde inclusive fizeram alusão aos 25 anos da sua morte (Maestro Belo Marques). Entendi apenas fazer aqui as correcções que precedem, a que junto alguns elementos que poderão ser menos conhecidos da sua vida e obra.

Começo pelo livro. É um livro de poemas, de nome Post-Scriptum, editado pela Portugália Editora não sei quando, mas em data posterior a 1981, ano em que o Maestro participou no programa da RTP “E o resto são cantigas”. Nesse programa, Belo Marques disse da pena que tinha de morrer sem ver os seus poemas publicados. O editor ouviu, gostou dos dois poemas que então foram lidos, e publicou o livro. Como a foto anexa exemplifica, foi um livro oferecido a várias pessoas no Sobral, emsessãohabitual no Café Central, de que era frequentador regular.

Embora seja conhecido como compositor de canções populares, há também algumas, fados em especial, de que é autor da música e da letra. Um dos mais conhecidos é “Grão de arroz”, cantado por Amália Rodrigues, que pode rever em http://www.youtube.com/watch?v=rO_Kk4Cmn4o. Compôs também música para filmes, tais como Rosa do Adro e As Pupilas do Senhor Reitor. Todavia, o objectivo inicial da vida de Belo Marques era ser compositor de música sinfónica. Esteve alguns anos em Moçambique, onde estudou a música negra. Em 2009, disse “a neta de Belo Marques, Guiomar, que ele compôs uma peça chamada Fantasia Negra, que foi tocada em público uma única vez. Ela está convencida de que esta é a grande obra do maestro. Não era certamente por “Alcobaça” que ele gostaria de ser lembrado (…)”. Pode ler isto e mais em http://llindegaard.blogspot.pt/2009/06/musica-negra-de-belo-marques.html.

Durante anos, no início da sua vida musical, Belo Marques era conhecido como o “Rapaz do violoncelo”, na tertúlia do Café Gelo, no Rossio. Os últimos anos de vida não terão sido muito entusiasmantes. Morreu na sequência de uma queda que deu quando caminhava, a pé, frente aos Correios do Sobral.

José Auzendo

7 comentários:

  1. Conheci muito bem o maestro Belo Marques pessoa muito simples e simpática. Atendi-o quando era funcionária da Câmara Municipal e ele já era muito educado e de bom trato. Acho que a sua carreira não foi devidamente reconhecida foi porque nunca se autopromoveu e ao contrário de muitos sem o seu mérito, não teve uma máquina montada para isso. Assim viveu e morreu simples
    e sem ter sido devidamente reconhecido. Manuela

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  2. Boa noite Professor Auzendo
    Há muitos anos que o nome de Belo Marques me é familiar. Porém, só há poucos anos soube da sua vida aqui no Sobral. Apenas o vi pessoalmente 1 vez, em 1964, aquando duma apresentação em que eu integrava o antigo Conjunto Musical Matono. Foi a única vez que o vi ao natural, e muito longe de vir a conhecer a sua história de vida, tantos anos depois.
    É pena que as pessoas que realmente têm valor nem sempre sejam reconhecidas em vida. Mas a vida é cheia de injustiças! E no "país das cunhas" quem não tem "padrinhos" muito excepcionalmente consegue singrar e alcançar o lugar que por direito e mérito deveria ocupar.
    Um abraço da
    Lourdes.

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  3. Quem viveu no Sobral na época do Maestro Belo Marques não esqueceu aquela figura miúda e um pouco descuidada, que aparecia na vila quase diariamente, e muitas vezes de carroça, com a bonita esposa ao seu lado, com enorme chapéu de palha na cabeça, para a proteger do sol.


    Quem conviveu com este Senhor sabe da sua facilidade em conversar. Quando o escutávamos, aquele homem pequeno tornava-se um gigante. Tinha um sentido de humor muito crítico, que o tornava encantador, pela sua graça natural. Só ouvindo-o sabíamos que estávamos a ouvir um “génio”. Foi uma sorte o Sobral ter tido como habitante um homem tão genial, não sei se muita gente se apercebeu da sorte que nos tinha calhado. Todavia, ele já estava habituado a que lhe não dessem as honras que merecia.



    Do seu livro Post-Scriptum escolhi estes versos:



    "Por má distribuição dos bens da Terra,

    Que torna a vida dura e faz a guerra

    Nos corações dos homens sem um guia,

    Pergunto às solidões do ser humano

    Se Deus criou o Homem por engano,

    Se o Homem criou Deus por cobardia."



    Muito obrigada professor Auzendo, por lembrar este homem, que o Sobral não deve nunca esquecer



    Maria Alexandrina

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  4. Obrigada Prof. Ausendo por esta recordação do homem maravilhoso, com imenso senso de humor e brincalhão.Não há adjetivos para descrever o seu carater e, por muito que me esforce hei-de sempre recordá-lo como uma pessoa alegre e que gostava de ter a familia em redor. Teve quatro filhos e infelizmente dois já morreram : o Fernando e o Abílio. Restam a Maria com 90 anos que os acompanhou ao Maestro e a esposa Guiomar até aos finais dos seus dias e, o Álvaro, o mais novo agora com 81 anos. Conheceu todos os netos mas já não os bisnetos.
    Pag. do Maestro do facebook :
    http://www.facebook.com/pages/Maestro-Belo-Marques/199566553389512

    Vera Belo Marques (neta, filha do Álvaro)

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  5. E quem não se lembra, durante alguns poucos anos antes da sua morte, da pequena figura, nas Pontes de Monfalim, à espera da carreira que vinha de Vila Franca, para ir tomar o seu bagacinho à esplanada do Central?
    Depois, era só puxar-lhe pela língua e lá vinham as histórias de concertos, viagens e encomendas. Andava sempre com um papel no bolso que mostrava e retirava logo da vista. nunca cheguei a saber o que era mas suponho que alguma obra que lhe ia na cabeça.
    Belo, Belo Marques.

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  6. Ora por puro acaso caio neste blog e leio coisas tão bonitas sobre o meu avô, que visitava várias vezes por ano à "quinta do Sobral" como diziamos em família. Engraçada coincidência porque nos últimos dois dias tenho pensado muito na quinta do avô, sem saber porquê.
    Pessoa maravilhosa era, apaixonado pela Natureza, por histórias engraçadas e situações pacatas. O seu sentido do humor bem reguila é o que não se esquece, além do talento, claro está !
    Obrigada

    Olga Belo Marques (outra neta, filha do Abilio)

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  7. Pois como vê, Olga Belo Marques, o seu avô continua a ser recordado com emoção e carinho por todos aqueles que com ele privaram cá pelo Sobral. E também por aqueles que, como é o meu caso, só o conheciam das "cantigas" e ficaram a conhecer melhor o Homem que ele foi ao ler o que sobre ele está publicado e ao ouvir relatos vivos daqueles que o conheceram...

    E eu soube que está a ser recolhido o espólio musical do Maestro para ser tratado, estudado e digitalizado. Este blogue gostaria de ser informado do final desse trabalho e como aceder a ele...Será que pode tomar a devida nota?

    Por hoje, obrigado por nos ter visitado. E se quiser trazer-nos outras notícias sobre ...

    Auzendo


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